quinta-feira, 13 de abril de 2017

A Inveja e o Alheio

     Outro dia desses, a Inveja encontrou o Alheio. Nada diferente do comum: desde pequenina a Inveja busca o Alheio em todas as suas formas e só fica feliz quando dele se apropria. Mas nesse dia especialmente, o Alheio estava revoltado:
     - Escute aqui, Inveja: estou cansado de você. Lembra quando eu era só um brinquedinho inocente no berço de seu irmão?
     - Claro! – os olhos de Inveja brilharam.
     - E quando eu era aquela caixa de lápis de cor de seu coleguinha de pré-escola?
     - Linda! – as sobrancelhas de Inveja arquearam-se.
     - E quando a professora falou que eu era a melhor nota da turma toda?
     - Sim. – o nariz de Inveja entortou-se.
     - E quando fui a roupa mais original daquela festa incrível, de que falaram por mais de um mês?
     - É. – sorriu Inveja, de lábios selados.
     - E quando era o grande amor de sua melhor amiga? Ou as flores mais belas com cartão misterioso chegando assim de repente no meio da roda?
     - Verdade... – engasgou-se Inveja.
     - E quando eu fui a merecida promoção daquele funcionário que você admirava, dizendo-se “branca”?
     - Sei... – os ombros de Inveja enrijeceram-se.
     - E quando fui a viagem mais divertida de seus primos?
     - Lembro. – o peito de Inveja se comprimiu.
     - E quando fui a reforma da casa de sua vizinha?
     - Que reforma! – o ventre de Inveja se contorceu.
     - E quando fui o prêmio revelação daquela artista maravilhosa?
     - Foi... – Inveja roeu uma de suas unhas.
     - E quando eu era apenas uma selfie bobíssima de um novo corte de cabelo de sua amiga ou do prato de comida de seu tio e tinha um monte de curtidas?
     - Eita! -  os punhos de Inveja cerraram-se.
     - Então...
     Mas antes que Alheio, magoado por anos, enfim concluísse todo o seu raciocínio, Inveja, com os olhos fixos no Alheio, abriu bem os braços, enlaçou-o, fagocitando-o.


Moral da história: A Inveja só se alimenta do Alheio se Você (“que não tinha entrado na história”) deixá-lo de bobeira por aí, repisando suas dores. 

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